segunda-feira, outubro 29, 2007

O "ranking" das escolas

Doisneau

Já tudo foi dito sobre o “ranking” das escolas e sobre a manipulação de que é alvo. Ao fim e ao cabo, tudo se reduz a problemas sociais e a condições que umas conseguem evitar e têm e as outras não. Mas talvez valha a pena olhar para estas listas como indicadores de uma geografia da exclusão que não só existe, como é fácil marcar num mapa. Não se trata de limitar tudo a uma espécie de determinismo que reduz os resultados escolares ao dinheiro, mas de perceber que os melhores resultados estão onde há mais condições, onde há mais emprego e, sobretudo, onde faz mais sentido ter bons resultados escolares, porque daí resultam vantagens. As reformas da escola fazem-se na economia e na sociedade.

Talvez por isso, a pressa com que a Ministra da Educação veio relativizar os números. Não interessa que se generalize a ideia de que a Escola está a ser usada como a única medida social de integração, em regiões onde a resposta do Estado se tem limitado a pagar a exclusão (o RSI não tem sido outra coisa)- repare-se no novo regime de faltas dos alunos. E não interessa, porque os resultados vão ser catastróficos: ninguém investe em algo (formação escolar) cujas vantagens não percebe, sobretudo se viver rodeado de referências (a família) que há muito deixaram de ter objectivos e que, mais do que viver, sobrevivem.

Mas o “ranking” pode ser o auxiliar de planeamento, se tal coisa houver. Por exemplo, escolhendo uma das muitas listas publicadas, vemos que a Escola de São Pedro do Sul ocupa a posição 188, a de Oliveira de Frades a 210 e a de Vouzela a 393. Comparando com outras listas, há pequenas diferenças que alteram a posição entre Oliveira e São Pedro- pouco significativo. Agora, como explicar a posição de Vouzela que no passado já obteve resultados bem melhores e que trabalha num meio com características semelhantes às dos outros dois concelhos? Pequenas respostas a dúvidas como esta, são o que verdadeiramente interessa e o que pode dar algum sentido a um “ranking” que tem tido um uso exibicionista de ataque pouco fundamentado à escola pública.

quinta-feira, outubro 25, 2007

Sublinhados nossos

Já devíamos ter falado no assunto que vimos, pela primeira vez, no “A Ilusão da Visão”, mas que tem informação actualizada no “Notícias d’Aldeia”. Trata-se de reivindicar a proibição da caça numa área que tem o estatuto de “Important Bird Area” atribuído pela Birdlife International e pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves. Se a caça se mantiver, será melhor chamar-lhe “o paraíso do caçador”. Há petição para assinar.

Águas negras

O Instituto Regulador de Águas e Resíduos publicou o relatório sobre a qualidade da água para consumo humano relativo a 2006. Por ele ficamos a saber que ainda existem situações graves de falta de qualidade no abastecimento deste bem essencial à população portuguesa, sobretudo em regiões do Interior. Chamem-nos demagógicos mas, não sei quantos milhões de fundos europeus depois, não sei quantos estádios de futebol e outra tanta obra inútil, é inadmissível este estado das coisas. Vale a pena ler, a este respeito, o “post” do “Estrago da Nação” com o significativo título “Os porcos estão mais protegidos do que alguns portugueses”.

Referendar a cidadania

Já aqui falamos no “Tratado de Lisboa” e na tentativa, assumida mais por uns do que por outros, de não o submeter ao referendo. Multiplicam-se os argumentos a favor e contra, mas, no que nos diz respeito, parece-nos que o assunto tem uma importância particular. Depois das alterações efectuadas na composição dos executivos municipais e do que se ouve a propósito da nova “lei eleitoral”, começa a estar em causa a própria democracia. Não basta calendarizar actos eleitorais- é preciso garantir a submissão dos eleitos aos eleitores. E se os temas são complexos, de leitura difícil, aprendam a apresentá-los com clareza. É por isso que se torna importante conhecer as iniciativas que começam a surgir a favor do referendo (como esta).

Construção alternativa

Há cada vez mais quem pense que arquitectos e engenheiros devem fazer um maior investimento na procura e aconselhamento de novos materiais de construção. Vai acabar por ser inevitável, devido à pressão imposta pela necessidade de reduzir o consumo de energia, mas, para já, o tijolo e o cimento reinam entre nós com custos ambientais significativos. Por isso, pensamos ser de todo o interesse divulgar experiências práticas neste domínio. A que apresentamos, fomos buscá-la ao “Quinta do Sargaçal” (que felizmente não acabou), mas tem um blogue onde se mostra a evolução da obra e se fala nas dificuldades encontradas.

segunda-feira, outubro 22, 2007

Mentiras em tom esverdeado

A reprodução desta imagem é proibida... por muito que apeteça.

Promover o pedestrianismo, o uso da bicicleta, a partilha do transporte individual, tudo excelentes ideias. Certo? Talvez não...

Um dos perigos que sempre se disse existir na apropriação do discurso ambiental por parte dos detentores dos cargos de poder, foi o de se criar a ideia de que os problemas se resolveriam apenas à custa da mudança de hábitos individuais. De facto, era previsível que essa seria a estratégia para transferir o preço da solução para o cidadão comum, evitando discussões sobre política económica e modelos de crescimento. É isso que está a acontecer.

Quando, recentemente, o governo lançou o projecto de construção de 10 novas barragens, algumas delas representando a perda irrecuperável de recursos naturais únicos (Sabor), a justificação foi o desenvolvimento das energias alternativas (nomeadamente a eólica) de modo a reduzir a emissão de gases responsáveis pelo efeito de estufa. Ficou por dizer que nada de significativo foi feito, até ao momento, para obrigar as indústrias a repensarem o seu consumo de energia (com reconhecidos desperdícios) e, para além de papel escrito, nada se fez para promover um salto qualitativo na construção, também ela com grandes responsabilidades na factura da electricidade.

Ainda mais recentemente, lemos o que está a ser pensado, no âmbito da União Europeia, para reduzir os estragos provocados pela circulação automóvel. Conselhos, conselhos e mais conselhos. Costumamos dizer, em bom português, que “de boas intenções está o inferno cheio”. Pois é disso mesmo que se trata. Pressão sobre a indústria para reduzir a dependência do petróleo? Isso é que era bom! Pressionar uma maior investimento no comboio? Esperem sentados. Falar claro sobre a irresponsabilidade de alguns governos que se mantêm indiferentes à necessidade de organizarem uma alternativa real ao nível do transporte público? Está bem, está...Cada um faz o que quer, quando quiser e... seja o que Deus quiser. Medidas concretas, só as que dependam de cada um de nós, simples cidadãos, que algum imposto há-de por aí vir para garantir a motivação para a actividade física ou, de preferência, para trocar de carro por outro menos poluente. “Business, just business”. Em tons de verde, claro.

Já agora, no que nos diz respeito a nós que resistimos fora das grandes cidades, a quem empurraram para o uso crescente do automóvel ou da camioneta, nem se fala. A malta não precisa. Pobrezinhos, mas limpinhos, pois então- antes fosse, mas os motivos são outros. Neste momento, 60% da população europeia vive já amontoada em “urbes” de grande e média dimensão e, muito em breve, serão 80%. Nós, os “outros”, pouco contamos em impostos e votos. Logo, pouco contamos. Ponto final. E na impossibilidade de irmos a Viseu ou a Aveiro a pé ou de bicicleta, pagamos. Pelas emissões do automóvel, pelo uso da estrada (sim, as portagens), pelo estacionamento. Pagamos pela defesa de um ambiente que é de todos, que tem sido destruído, sobretudo, por alguns, mas cuja factura dos estragos será entregue aos do costume: os mais fracos.

Resumindo e concluindo, tudo se limita à tentativa de nos convencerem de que a solução está em andarmos mais a pé, darmos mais ao pedal e não nos esquecermos de apagar a luz. É a mentira “verde”, cor que, pelos vistos, fica bem com tudo (e com todos). Porque as notas de cem também são verdes. Ou esverdeadas.

sexta-feira, outubro 19, 2007

Obrigadinho

© Robert e Shana ParkeHarrison.

. A redução do número de acidentes na A25, comparativamente com o que se passava no IP5, levou os responsáveis a reconhecer que o traçado mal feito, a pedido de interesses nunca assumidos, esteve na origem de muitas das situações graves ali vividas. Centenas de mortes depois. Calculamos que as famílias das vítimas agradeçam o reconhecimento da sua razão.

. Mantendo-se na lista das mais endividadas, a Câmara Municipal de Vouzela não tem conseguido “fazer obra”, o que contribuiu para que não tenha aumentado a área do concelho afectada por estragos. Os cidadãos que sempre disseram que eles estão bem é quando estão quietos, agradecem o reconhecimento da sua razão e, se prometerem continuar assim, até podem pensar em dar-lhes o voto.

. Portugal atingiu os objectivos na redução do défice. Ao mesmo tempo, ficamos a saber que existem 2 milhões de pobres entre nós e que aumenta a diferença entre os muito ricos e os muitos pobres. Ou seja, tal como suspeitávamos, essa treta do défice em nada contribuiu para a nossa felicidade. Os portugueses que não são filhos do senhor Jardim Gonçalves, agradecem o reconhecimento da sua razão.

. O petróleo prepara-se para, mais uma vez, justificar o avanço para a guerra. Ao mesmo tempo, não há governo que não jure tudo estar a fazer para reduzir o seu consumo, a começar pelo dos Estados Unidos. Aqueles que sempre disseram que enquanto houver um cêntimo a ganhar com o estrago, o discurso ambiental não vai passar de palavras, agradecem o reconhecimento da sua razão.

. Os jornais noticiam que o novo Tratado da União Europeia é incompreensível, depois de já terem noticiado o empenho dos diversos governos em evitar o seu referendo. Todos os que pensam que a grande preocupação desta Europa é arranjar maneira de acabar com os cidadãos, agradecem. O reconhecimento da sua razão.

terça-feira, outubro 16, 2007

Turismo... pois, o turismo

Doisneau

Turismo... pois, o turismo. É a ele que se confiam todas as regiões a que se não sabe o que fazer, assim uma espécie de Senhora dos Aflitos da actividade económica. Na realidade (e com as excepções do costume), tem sido mais um pretexto para construir sem limites nem sentido. Não só em Portugal.

Assim, não admira o diagnóstico feito pela Agência Europeia do Ambiente aos estragos provocados pela actividade: excesso de urbanização, elevado consumo de água, lixo e perda da biodiversidade. Curiosamente, já em Maio deste ano, o senhor Jean-Claude Baumgarten, presidente executivo do Conselho Mundial de Viagens e Turismo, avisava durante a sua estadia em Portugal: “não façam como a Espanha, não construam demais”. Pois sim...

O nosso principal problema, o nosso principal recurso

Este tema levanta importantes áreas de reflexão que interessam- muito- a Lafões. Não temos o caos do Algarve, não somos ameaçados pela cobiça que paira sobre o litoral alentejano, mas temos sido dirigidos por gente que bem gostaria de aqui ver instalados esse caos e essa cobiça. Gente, para quem é preciso “domesticar” o território, construir tudo, desde o simples “parque de merendas” até ao parque de estacionamento em cada ponto de interesse, passando pela plataforma, aplanada, de preferência cimentada para estender a toalha. Gente que se relaciona mal com as características naturais e históricas do sítio onde vive. Este é o nosso principal problema.

Turismo é, por definição, movimento, viagem. Ora, ninguém sai do mesmo sítio se não for para conhecer coisas diferentes. Quem quer estar fechado num hotel, não precisa vir para aqui, nem vem. Optar pela região de Lafões resulta da vontade em conhecer a paisagem serrana com toda a sua riqueza e contrastes, a variedade do seu património natural e edificado, a especificidade da sua gastronomia e do seu artesanato. Tudo isto existe sem necessitar de um tostão ou de uma gota de suor dos nossos responsáveis. Mais: de acordo com todos os estudos são esses os nossos principais recursos, os que mais atraem o turista, os eixos estruturantes obrigatórios de todos os projectos.

Dos responsáveis locais apenas se deseja que saibam organizar, “evitando a decoração pela decoração”, uma rede integrada de serviços que facilite e enriqueça o contacto com o meio envolvente, tendo em conta os destinatários (o mercado). De forma discreta, respeitando as duas regras de ouro destas coisas:
1º- o principal protagonista é o meio e não o presidente da câmara, o presidente da junta, o industrial, o comerciante;
2º- a preservação do meio (a galinha dos ovos de ouro) obriga a definir limites de ocupação, ou seja, o ponto a partir do qual começa o estrago.

Assumir as especificidades da região

Infelizmente, não é isso que se tem feito. Para além das intervenções desordenadas que se têm permitido, com significativos impactos na paisagem, alguns dos empreendimentos pura e simplesmente ignoram as especificidades locais. Veja-se, por exemplo, o sítio na net das Termas de São Pedro do Sul, o nosso principal serviço turístico (aqui). Será difícil encontrar melhor exemplo de incapacidade de assumir a região em que se insere, sentindo-se, ainda, o velho tique provinciano de não querer falar em nada que saia dos estreitos limites do concelho. Por muito simpáticas que consideremos as duas “recepcionistas” da página, nada ali existe que nos revele a relação entre o empreendimento e as características naturais da sua localização. E se a ideia é apresentarem-se como alternativa a uma viagem ao Hawai... esqueçam (já agora, onde será que foram buscar a ideia dos castores?). Só por curiosidade, compare-se com a página das termas de Spa (Bélgica) e veja-se o seu álbum de fotografias (aqui).

Não é, pois, de estranhar a avaliação negativa que mereceram no “Estudo de Planeamento de Marketing para a Região de Turismo Dão Lafões”, da responsabilidade do Instituto de Planeamento e Desenvolvimento do Turismo. Para sermos rigorosos (e independentemente do estilo promocional com que a Câmara Municipal de Vouzela gosta de divulgar os números), a avaliação negativa tem que se estender a toda a região de Lafões e a muitos dos que se têm debruçado sobre este assunto. Recorde-se, a este respeito, que as principais medidas propostas no estudo desenvolvido pelo Instituto de Estudos Regionais e Urbanos da Universidade de Coimbra e intitulado “Que projectos para o desenvolvimento de Lafões”, eram a “instalação de um restaurante com gastronomia regional num grande centro comercial de Lisboa ou Porto” e a abertura de um Hotel Geriátrico, devido ao envelhecimento da população. Estamos a brincar?

De facto, o envelhecimento da população europeia ( e não apenas portuguesa) pode e deve ser encarado como potencial mercado. No entanto, como já por aí escrevemos, hotéis de qualidade, entendidos como unidades isoladas, é o que não falta por essa Europa fora. O que essas pessoas podem vir procurar “é o usufruto do espaço, é a alternativa aos grandes centros urbanos, é o paradigma da diferença. Longe de se contentarem com unidades isoladas ou 'centros históricos' de delimitação duvidosa, vão procurar a vivência só possível numa região inteira, que saiba preservar e permitir o uso do seu património natural e edificado, fornecendo, ao mesmo tempo, as melhores respostas ao nível das comunicações, da saúde e da segurança. Elas vão ter idade e cultura para saberem o que querem e dinheiro para o pagar” . Será que conseguiremos resistir de modo a aproveitar a oportunidade?

domingo, outubro 14, 2007

Lafões ainda é

A propósito da edição de uma monografia sobre o espaço onde está o jardim da Fundação Gulbenkian, lêem-se no “Público” de hoje, os dez princípios que, de acordo com o Arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles, devem ser respeitados na criação de um jardim:

1º A sublimação do lugar tornando-o feliz e ameno;
2º A presença da água, traduzida na sua serenidade estética, movimento ritmado e dinâmica musical;
3º A pujança da natureza compreendida na sua diversidade biológica e no ritmo de vida;
4º Esplendor da luz conseguido através do contraste sombra-claridade e da harmonia de cores;
5º A profundidade das perspectivas e o recorte dos sucessivos planos conseguindo valorizar distâncias e formas;
6º A integração na paisagem envolvente sempre que esta seja ordenada e bela;
7º Aceitar como base da concepção do jardim ou da paisagem a “ordem natural”, ou seja, da natureza liberta da acepção da sociedade humana;
8º Impor à “ordem natural” a “ordem cultural” que sublimará aquela em face do seu único utente: o homem;
9º Exaltar no jardim ou na paisagem a simplicidade no ordenamento das coisas,
evitando a decoração pela decoração;
10º Um jardim e uma paisagem são fruto de concepções e projectos
e nunca de arranjos ou decorações, pelo que a sua grande beleza resulta no que lhes é essencial na medida certa.

Os sublinhados são nossos, mas a conclusão é simples: a “Mãe Natureza” deu-nos tudo isto de borla. Tal como diz a canção, “Lafões (ainda) é um jardim...”. Devia, pois, ser classificado e punido qualquer acto contra a sua preservação.
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PS: De algum modo relacionado com isto, vale a pena ler o texto ‘Pleistocene re-wilding’ merits serious consideration also outside North America, a partir deste post do "Ambio". Para reflectir.

sexta-feira, outubro 12, 2007

Reorganizar o comércio de Vouzela

Rua Conselheiro Morais Carvalho, anos 30 (Vouzela- antiga Capital de Lafões e seus arredores)

Numa iniciativa das Associações Empresariais de Lafões e de Lamego, os comerciantes de Vouzela foram a Ourense, contactar com a organização do seu comércio. Excelente iniciativa que devia servir de exemplo a outras actividades: conhecer realidades diferentes, ajuda muito a acabar com ideias feitas...

Da viagem, parece ter resultado algum entusiasmo pelo estilo “centro comercial ao ar livre” ou “centro comercial aberto”, adoptado na localidade espanhola. Fazemos votos para que assim seja. Isto, porque Vouzela tem todas as condições para adoptar esse modelo, devido à concentração de lojas num espaço relativamente pequeno, sobretudo no chamado “centro histórico”, a que apenas falta o fundamental: a organização.

Não é possível querer revitalizar o comércio e ter uma concentração excessiva da oferta numa ou duas áreas de negócio, desprezando todas as outras onde ou não há qualidade ou... não há. Não é possível ignorar os fluxos turísticos, mantendo horários de funcionamento iguais toda a semana e todo o ano- Vouzela é uma terra fechada a partir das 22 horas, mesmo nas alturas de maior movimento. Não é possível querer chamar as pessoas de fora e oferecer o que qualquer outro em qualquer parte do país oferece, quando os que apostam no “local” (alguns cafés e restaurantes), não parecem ter razão de queixa- como na história do ovo e da galinha, deixou de se privilegiar os produtos locais que cada vez há menos e cada vez há menos porque deixaram de ser divulgados.

É preciso reconhecer que não é fácil ser comerciante numa localidade com as características da nossa. Com um mercado extremamente heterogéneo e já não beneficiando da facilidade de todas as freguesias dos arredores se virem aqui abastecer, o comércio de Vouzela foi definhando e muitos dos seus moradores perderam o hábito de comprar nas suas lojas. Para agravar a situação, a desestruturação de algumas das actividades económicas e a incapacidade em arranjar alternativas, fizeram com que tenhamos um baixo poder de compra. Mas há um caminho por percorrer. Se o fizerem de forma organizada, integrada e solidária; se as cabeças se mantiverem abertas como o modelo que se defende, não só acreditamos no futuro do comércio de Vouzela, como acreditamos que ele possa constituir um polo dinamizador de outras actividades. Bem precisamos.

quarta-feira, outubro 10, 2007

Para guardar em local seco

(Foto: José Campos)

O rio ainda corre livremente, as vindimas estão feitas, os presidentes das nossas câmaras têm permanecido em silêncio- gozemos a paz enquanto dura. Estamos em tempo de armazenar. “Colher a castanha, noz e avelã e, para guardar em local seco, abóboras e melões(...)”- assim manda o “Borda d’Água”, para o mês de Outubro. Pois colhemos e guardamos o que outros dizem e nos ensinam. Para consumir mais tarde.

Sobre as 10 novas barragens

No “Estrago da Nação” são feitas algumas reflexões interessantes sobre o assunto. O Plano está em discussão pública, mas, segundo o ministro, não vale a pena termos o trabalho de opinar porque nada será alterado. Entretanto, começa a ficar claro como a água que os charcos só vão servir os interesses do “lobby das eólicas”. Depois da selvajaria dos eucaliptos, a das “ventoinhas”.

Empresas e defesa do ambiente

Já que falamos das eólicas e se prevê longo debate sobre as chamadas “empresas verdes”, é de elementar justiça divulgar a "Associação de Conservação do Habitat do Lobo Ibérico nas Serras da Freita, Arada e Montemuro" . A organização para a defesa da espécie, conta entre os fundadores as seguintes empresas: Eólica da Cabreira, S.A., Eólica da Arada – Empreendimentos Eólicos da Serra da Arada, S.A. e Eólica de Montemuro, S.ª Para conhecer actividades desenvolvidas e a desenvolver e para se tirarem conclusões sobre a relação entre iniciativa privada e defesa do ambiente, visite-se o sítio da associação na Internet (procurar a partir daqui)

Por uma assembleia de condóminos

É um projecto lançado pela “Quercus” que consiste em pensar o Planeta como se de um condomínio se tratasse. Para além de áreas- “micro-reservas”- de Portugal, o projecto conta já, também, com a participação de regiões do Brasil. A estudar com atenção, até porque o "condomínio" que temos frequentado, precisa mudar de... administrador.

Em busca da “Ilha da Utopia”

Pois é: constroem, constroem e depois começam a suspirar por bosques verdejantes, águas cristalinas e passarinhos a chilrear. A partir da “Barriga de um Arquitecto” ficamos a conhecer o concurso “The Park at the Center of the World: Five Vision for Governors Island”. A nova “ilha da Utopia” e uma forma de acabarmos em beleza.

domingo, outubro 07, 2007

Águas paradas

Lembraram-se de nós. Infelizmente. Fomos contemplados com uma das barragens com que o governo de Sócrates quer salvar o mundo, pelo menos o dele. Nós, os pós- socráticos, assumimo-nos cépticos, preferindo realçar que a obra é lançada sem que nada tenha sido feito para reduzir o desperdício de energia. E que desperdício…

Mas na antevisão do charco gigante previsto para o Vouga, os autarcas opinaram. E um deles deu largas à imaginação, falando de “actividades geradoras de mais valias económicas, como sejam os desportos náuticos” (Lusa, 4 de Outubro de 2007). Já estou a ver: um enorme recreio com monitores, quem sabe se umas máquinas de fazer ondas e aulas de surf ou jet- ski e, de certeza, aparelhagens sonoras a berrarem “levante o seu astrauuuuu!”, com sotaque brasileiro, porque tem mais ritmo. Nada de novo. Apenas o assumir de um conceito de turismo que nos vai arruinando o território, a paciência e tudo o resto. Sobretudo, um conceito que não percebe que o segredo do turismo está na diferença e não na uniformidade.

A região de Lafões será procurada enquanto a deixarem mostrar o que é. Deixará de o ser, quando a quiserem transformar numa espécie de Algarve, de Lisboa, ou o raio que os parta. Mas, com a retenção de águas que se avizinha, ainda vai aparecer algum a querer bordejá-la de palmeiras, prática que fez escola na gestão autárquica portuguesa. Talvez- porque não?- um coqueiro, que até pode justificar uma visita presidencial.

Vão-nos prender as águas, mas vai-se libertar a asneira. Querem apostar?

quinta-feira, outubro 04, 2007

Lindo serviço...

Integrada na “Quinzena da Habitação” (iniciativa no âmbito da presidência portuguesa da União Europeia), foi feita a divulgação pública de parte do trabalho da equipa responsável pelo Plano Estratégico da Habitação (PEH). As conclusões finais só estão previstas para o próximo mês de Março, mas existem já indicadores que merecem reflexão.

De tudo quanto foi divulgado, o mais surpreendente talvez tenha sido o facto de ainda faltarem perto de 200 mil fogos para responder às necessidades da população (Público, 3/10/2007). Lindo serviço. Andámos nós a “cimentar” o país de lés a lés e chegamos à triste conclusão que ainda não chega! É desta que nos lançamos à conquista de Espanha...

Será interessante analisar o relatório final, mas pensamos que a perversão esteja relacionada com o êxodo rumo ao litoral, tendo havido excesso de construção precisamente onde não era necessária. Isto reaviva a polémica sobre a capacidade da iniciativa privada, por si só, conseguir responder às necessidades de uma área socialmente tão importante como a da habitação, para além de deixar de rastos os critérios dos nossos autarcas.

As restantes conclusões divulgadas, vão ao encontro da percepção que vamos tendo do fenómeno: necessidade de privilegiar a reabilitação, peso excessivo da compra da habitação devido à falta de um mercado de arrendamento (provocando um endividamento equivalente a 117% do rendimento das famílias!), ineficácia da política social. Registe-se pela sua importância, o facto de cerca de 20% da população portuguesa não ter condições para aceder à habitação sem apoio.

Os trabalhos do grupo responsável pelo PEH podem ser acompanhados aqui. Pela semelhança com a realidade de Lafões, chamamos a atenção para a síntese das conclusões do Fórum Regional de Vila Real (aqui).

quarta-feira, outubro 03, 2007

O passado e o presente da linha do Vale do Vouga

(Foto de Pastel de Vouzela)

Para recordar um comboio que já houve e que não se soube aproveitar. Façam o favor do "clicar".

3- Comemoração do Centenário da chegada do comboio a Vouzela: "Temos um comboio para apanhar"- 05/11/2013
2- Linha do Vale do Vouga: uma viagem ao que resta (01/10/2007)
1- Era uma vez, o comboio... (30/01/2007)

segunda-feira, outubro 01, 2007

Linha do Vale do Vouga:uma viagem ao que resta

Aproximava-se o fim. A poucos metros do local de onde foi conseguida esta imagem, está hoje um prédio
(foto de Guilherme Figueiredo)

Não vale a pena perder muito tempo com o assunto: o encerramento da linha do Vale do Vouga foi, na hipótese mais suave, uma tremenda irresponsabilidade; na mais dura, uma vigarice, cuja história há-de ser contada sem poupar nos pormenores sórdidos. Ponto final. O que nos parece ser de realçar é o modo como muitos trabalham para manter a memória viva, publicando estudos, organizando arquivos de imagens e até divulgando petições pela sua reactivação. Todos, lá bem no íntimo, mantêm viva a esperança de que a asneira não seja irreversível. Ao fim e ao cabo, para além do recurso turístico que podia ter sido, o comboio é a melhor alternativa a uma circulação automóvel que o futuro, inevitavelmente, irá limitar.

A construção da linha do Vale do Vouga sucedeu ao projecto de tornar o rio navegável desde Aveiro até São Pedro do Sul. Não tivessem as tropas de Junot invadido o país e talvez a obra fosse concretizada (1).

A verdade é que, depois de muita polémica a propósito do melhor traçado, a data oficial de inauguração da via férrea que nos havia de ligar ao litoral fixou-se a 23 de Novembro de 1908 (troço entre Espinho e Oliveira de Azeméis). Já depois da instauração da República, foi feita a ligação entre Aveiro e a Sernada (Setembro de 1911) e, finalmente, em 5 de Fevereiro de 1914, até Viseu.

A velha linha resistiu às dificuldades de duas guerras mundiais, mas não conseguiu enfrentar o “boom” do automóvel em Portugal (e das empresas de camionagem), nem as exigências de maior velocidade e comodidade. Na verdade, sendo uma linha de via estreita, nunca beneficiou de modernizações significativas e a tentativa de aumentar a velocidade de circulação através de automotoras, revelou-se pouco satisfatória.

Foi isso que deu força à ofensiva favorável ao encerramento, que teve o seu auge nos anos 70. Do mesmo lado da barricada, misturaram-se os argumentos dos que defendiam investimentos para a melhorar e dos que preferiam acabar com ela: que não justificava as despesas, que havia meios de transporte alternativos, que... causava fogos. Em 1972, o comboio era substituído por camionetas da CP, embora isso não fosse assumido como definitivo. A verdade é que, dois anos depois, a 10 de Janeiro de 1974, o Notícias de Vouzela publicava, na sua primeira página, o seguinte desabafo, ilustrado por uma fotografia da estação: “O que irá ser um dia, este terreno enorme, no centro da vila, que foi, durante sessenta anos, estação do caminho de ferro? Porque já não acreditamos que o comboio regresse (...)".

A população nunca se resignou. Logo após o 25 de Abril, há registo de diversas tomadas de posição que obrigaram os governantes a prometerem não só o regresso do comboio como, também, a melhoria das suas condições. Ele voltou, mas nunca melhorou. E íam começar os tempos dourados da construção civil.

A 27 de Dezembro de 1983, setenta e cinco anos, um mês e quatro dias depois da inauguração do primeiro troço da linha, o Vale do Vouga assistiu à última viagem do seu combóio. Na sua obra “Memórias do Vale do Vouga”, o médico Manuel Castro Pereira antecipou: “Novos e difíceis tempos virão, onde a ferrovia tem de desempenhar um papel decisivo de alternativa de transporte de pessoas e bens”. Esses tempos aí estão, apesar dos nossos governantes, nacionais e locais, assobiarem para o lado, na tentativa desesperada de que não nos lembremos de lhes pedir responsabilidades.

Depois de já termos divulgado páginas de fotografias recordando a linha no seu auge, propomos agora uma viagem pelo que existe. São imagens de abandono, de desleixo, da pressa com que alguns “urbanizaram” o espaço. Nós próprios, apesar de termos limitado o estrago, não evitámos construir lá um prédio (erro já assumido pela Câmara Municipal de Vouzela). Mas, numa altura em que alguns discutem o que fazer com as pontes que eram usadas pelo comboio, esta viagem que propomos à estupidez e ao desperdício, é o nosso contributo para que não se agrave a asneira. E para que ela não seja irreversível. Porque, mais cedo ou mais tarde, o comboio vai regressar.

Que a viagem comece (basta "clicar")
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(1)- As referências históricas foram retiradas da obra Vouzela- A Terra, os Homens e a Alma, Vouzela, 2001.