sexta-feira, agosto 31, 2007

Não acredito

Será verdade que, durante um debate sobre as alterações previstas para a Avenida João de Melo (recordar aqui), um técnico responsável da Câmara Municipal de Vouzela opinou que, “se o problema são os azulejos (da casa que se pretende "furar"), compram-se outros azulejos”? Não acredito... Até porque um “técnico responsável” sabe qual é a idade do edifício. Sabe, por exemplo, que se trata de uma construção já existente na altura em que se edificaram as instalações onde, hoje, arruma a secretária. Também sabe que, apesar de não existirem na região, significativos exemplares que integrem a lista das “sete maravilhas da humanidade”, isso não justifica que se dê largas ao camartelo, ao sabor dos devaneios de um qualquer autarca ou... “técnico responsável”. Até porque a memória dos homens não se faz só de monumentos de significado universal. Mas, de facto, o problema não são os azulejos- e um "técnico responsável" sabe-o.

O que talvez o “técnico responsável” não saiba, é que a nossa desconfiança seria menor, caso os da sua “escola modernizadora” já tivessem mostrado obra de jeito, coisa que, até agora, não fizeram. Nenhum dos mais recentes edifícios de Vouzela vai estar envolvido em qualquer polémica dentro de cem anos, pelo simples motivo de não durar tanto tempo- valha-nos isso! Logo, à falta de inspiração para fazerem melhor... estejam quietinhos. Mas, não deve ser verdade. Pelo menos, eu não acredito.

quarta-feira, agosto 29, 2007

São Macário para além das eólicas

Serra de São Macário. Uma das mais deslumbrantes paisagens que ainda se podem desfrutar no nosso país. No Inverno, só é aconselhável a adeptos de emoções fortes. Mas, mal a Primavera dá os primeiros sinais, impressionam os amplos horizontes e a variedade de cores da vegetação que cobre os montes. Depois, aconselha-se uma visita à capela e arriscar a descida à conhecida Aldeia da Pena. Vale a pena. Pena é que a Câmara de São Pedro do Sul, entretida que anda a procurar espaço para construção sem sentido, não consiga uns trocos para arranjar a estrada e melhorar o aspecto geral da aldeia.

Neste Agosto de tempo incerto, as nuvens limitaram-nos as vistas. De qualquer modo, nunca nos cansamos de passear por este reino do xisto e da lousa, terminando com uma visita ao artesão António e um petisco de presunto com broa.

sexta-feira, agosto 24, 2007

Excessivamente bem ensaiada…

“(…) os media podem dirigir, efectivamente, a percepção da realidade desde que não existam informações que a contrariem. E ainda que não possam moldar cada opinião individual sobre cada assunto particular, podem, isso sim, delimitar a realidade perceptiva geral no interior da qual se vão formar as opiniões. Aqui radica, talvez, o seu aspecto mais importante: estabelecer a ordem do dia para todos, organizando o espaço público, as questões em que pensar”.

- A Formação da Mentalidade Submissa, Vicente Romano, Porto, Deriva Editores, 2006, p. 159

A história do milho transgénico de Silves, tocou a cerrar fileiras, não contra os OGM ou a seu favor, mas sim na defesa da inviolabilidade da propriedade privada. Aliás, não se via nada assim, desde os “vendavais” do PREC. As edições do Público são um bom exemplo do que afirmo. Até professores doutores em Biologia e “ambientalistas encartados” tiveram direito a espaço para dissertarem sobre tácticas e estratégias de acções de protesto, sem uma única vez usarem os seus doutos conhecimentos para dizerem o que quer que fosse sobre o milho. No entanto, reconheço que a acção da “Verde Eufémia” esteve longe de ser bem organizada. Bem melhor seria pôr o ministro a lamber-se com umas papas feitas com aquele material e fazer dele um “case study”.

Curioso é verificar que, passados todos estes dias, não estamos mais informados sobre os OGM, nem sobre o modo como estão a ser controlados os diversos hectares desses produtos espalhados pelo país (se é que estão). Não foram essas as questões em que quiseram que pensássemos. É pena. Até porque, como foi reconhecido pela Associação Nacional dos Produtores de Milho e Sogro (Anpromis), os transgénicos fazem parte da estratégia para enfrentar os “novos desafios que se colocam aos agricultores” (Público de 22 de Agosto) e sobre os quais também nada sabemos- só suspeitamos…

Também não sabemos o que levou os activistas da “Verde Eufémia” a escolher aquela propriedade como alvo, quando era fácil prever que a sua pequena dimensão iria ser aproveitada para denegrir a iniciativa. Por estranho que pareça, nem sabemos o que move tal organização, quando as declarações do seu dirigente (que falava em “repor a normalidade ecológica”) davam pano para mangas.

De facto, ficamos com a sensação de ter assistido a um drama, em que só uma parte estava bem ensaiada: a da feroz mobilização informativa a favor da inviolabilidade da propriedade privada. Excessivamente bem ensaiada…

terça-feira, agosto 21, 2007

O primeiro milho é dos pardais

(O pardal voou a partir daqui)

Portugal assistiu à radicalização das formas de protesto sobre questões ambientais. Lutando contra os produtos transgénicos, cerca de uma centena de activistas de um movimento denominado “Verde Eufémia”, invadiu uma propriedade em Silves e destruiu perto de um hectare de milho geneticamente modificado.

O tom geral da notícia, difundida pela comunicação social, era de espanto e de choque. Ao fim e ao cabo, é saber de ciência certa que somos um povo de “brandos costumes”. Depois, onde está o folclore habitual neste tipo de acções, coisas bonitas para televisão ver, com bombos e sardinha assada, discursos e queixas para as instâncias internacionais? Caramba, foi logo a “arrear”, invadindo propriedade privada, sem dar hipótese ao “funcionamento das instituições”…

No entanto, quem quiser analisar os acontecimentos sem preconceitos ou hipocrisia, percebe que, pela primeira vez no nosso país, fomos confrontados com a verdadeira essência da luta ambiental: a ditadura dos interesses privados fere de morte o interesse colectivo.

Limitando-nos ao tema da discórdia, temos que reconhecer que a própria atitude da União Europeia, deixa muito a desejar. Tendo começado por assumir fortes suspeitas sobre os transgénicos, acabou por permitir a sua legalização (em Portugal isso aconteceu em 2005), não porque alguma informação científica tenha posto de lado os receios iniciais, mas pelos ditames de uma estratégia concorrencial com os Estados Unidos. Mantêm-se todas as dúvidas sobre as consequências para a saúde humana e para as culturas biológicas. Tal como o milho, a “instituição” não mostrou ser digna de confiança.

A nível mundial, as preocupações ambientais têm sido “adormecidas” por uma estratégia de “faz de conta” adoptada pelos diversos governos. Quando muito, atitudes mais estruturadas são tomadas a propósito do “negócio verde”, como sucede já com as energias alternativas, sobretudo com o biocombustível. Biocombustível que, longe de ser solução, ameaça criar mais um problema, até pela força que vai dar aos organismos geneticamente modificados, dada a exigência da sua produção intensiva. Ora, por esclarecer continuam as dúvidas sobre a sua ameaça para a saúde de todas as formas de vida, que não são protegidas pelos muros de uma qualquer propriedade. Privada. Até porque “o primeiro milho é dos pardais” que, tal como o ambiente, não têm fronteiras, nem aceitam dono.
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PS: Significativamente, os comentários a estes acontecimentos, desde o ministro da Agricultura, até Pacheco Pereira, passando por Vasco Graça Moura, nada avançam sobre as legítimas preocupações com os produtos transgénicos e a total ausência de protecção dos cidadãos face aos interesses a eles ligados. Toda a retórica se limitou à "invasão de propriedade privada". De algum modo, têm razão: é aí mesmo que temos que centrar o debate, sabendo até que ponto os interesses privados podem limitar os colectivos.

sexta-feira, agosto 10, 2007

Cá vamos, pela sombra

Não uma qualquer, mas a refrescante sombra de um belíssimo exemplar de carvalho (negral ou roble, os especialistas que se pronunciem). Alguns, ainda os guardam na memória, outros têm o privilégio de conviver com eles. Como nós. Em tempos, cobriram grande parte do nosso território e foram fonte de alimento de pessoas e animais (o pão de bolotas moídas, por exemplo). Da sua madeira, fizeram-se pipas, mobílias, naus. Mas, o crescimento lento que caracteriza a espécie, acabou por torná-la vulnerável ao ritmo da exploração. A opção pelo pinheiro e pelo eucalipto, acabaram com o resto. Permanecem a sua memória (bem presente, ainda, na nossa toponímia) e algumas manchas dispersas, de que a nossa região guarda parte significativa. Resta saber até quando, já que não é espécie protegida, apesar de o sermos por ela: “O papel regulador climático do ecossistema carvalhal tende (...) a criar condições microclimáticas que permitem reduzir o risco de ocorrência de incêndios.” (1)

Pois é por esta sombra que vamos, uns dias, mudar de ares. O Pastel de Vouzela vai seguir em “lume brando”. Até ao nosso regresso.
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(1)- Árvores e florestas de Portugal, Vol. 2, Os carvalhais- um património a conservar, Coordenação de Joaquim Sande Lemos, Lisboa, Público Comunicação Social, SA e Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, 2007, pag. 126.

quinta-feira, agosto 09, 2007

Triste sina...

A propósito da abertura da área de serviço de Vouzela na A25, o Presidente da Câmara afirmou: “a partir de agora, Vouzela passa a ter o seu nome ainda mais divulgado na A25 e todos os automobilistas que utilizam esta via vão ter o nome do concelho sempre presente”. Consta que também prometeu usar o espaço para divulgar produtos regionais e actividades turísticas.

Triste sina a de uma terra com séculos de História e um invejável património natural e edificado, ter a sua divulgação dependente dos croquetes e panados que levem os apressados automobilistas a uma área de serviço. Mas, significativo, também, quanto ao conceito de turismo defendido pelo mais alto responsável pelo concelho: se a estrada não traz gente a/ para Vouzela, leva-se Vouzela à estrada. Espera-se que não seja atropelada.

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PS1: Quase jurava que as declarações do presidente Telmo Antunes, estiveram em destaque na página da Câmara Municipal de Vouzela. Depois... desapareceram. Alguém se apercebeu de que há alturas em que o melhor a fazer, é mesmo ficar calado?

PS2: O mais importante nesta área de serviço é o sistema “vapor saver” que aí vai ser testado e que permitirá “reaproveitar os vapores provenientes do abastecimento das viaturas em novo combustível”. Não sabemos como funciona, mas soa bem. Voltaremos ao assunto.

segunda-feira, agosto 06, 2007

Os números não enganam...

Já houve um responsável destes sítios que afirmou ter números que provavam estar a haver um crescimento da população. A ideia do senhor, era justificar a justeza da política do betão, fazendo uma relação directa entre tijolo posto e habitante entrado. Pois os números, os genuínos, aí estão. São do Instituto Nacional de Estatística e actualizam os do último censos (2001). Nem crescimento, nem sequer manutenção: embora com diferenças, a região continua a perder gente. No que diz respeito a Vouzela, é o concelho com menor número de habitantes entre os 0 e os 14 anos e aquele que apresenta valores mais altos nos índices de envelhecimento. Por isso, continuem a meter-lhe cimento em cima porque, está visto, esse é o caminho. Já agora, desenhem-lhe (no cimento) uma cruz e afixem-lhe uma lápide: “Aqui jaz uma terra que tinha tudo para dar certo, mas não houve engenho para tocar tão fino instrumento”. O Pastel de Vouzela disponibiliza, aqui, um resumo para reflectir.

domingo, agosto 05, 2007

RE.CI.PRO.CO.

Trata-se da abreviatura de Relações de Cidadania entre Produtores e Consumidores (RE.CI.PRO.CO), projecto que pode vir a dar resposta à necessidade de se organizar a distribuição e promoção de produtos locais. Conta com a colaboração da ADDLAP (Associação de Desenvolvimento Dão Lafões e Alto Paiva), do Projecto Criar Raízes e da Câmara Municipal de São Pedro do Sul e quer alargar o conceito a nível nacional. Experiência a acompanhar com atenção e a conhecer melhor, aqui (e aqui). Às quartas-feiras estão em Vouzela a vender os seus cabazes, constituídos, para já, por frutos e legumes “colhidos na véspera", ervas aromáticas, mel e compotas.

quinta-feira, agosto 02, 2007

Construção a preços controlados: quem se vai "picar"?

(Alfinete, Regina Silveira)

No acordo entre o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda para a Câmara de Lisboa, consta a promessa de revisão do PDM, de modo a garantir uma percentagem de construção a preços controlados. De um modo geral, os comentadores não sabem o que dizer sobre a medida, oscilando entre a desvalorização e a denúncia de radicalismo. Só a AECOPS (Associação das Empresas de Construção e Obras Públicas) parece ter compreendido que o céu lhes pode cair em cima.

Naquela linha “generalista” dos nossos políticos, que tanto dá para concorrerem a uma câmara municipal, como à chefia do Ministério da Educação, o candidato do PSD, Fernando Negrão, logo agitou o papão da “extrema-esquerda” que, segundo ele, passaria a dominar a autarquia da Capital. Carmona Rodrigues, como de costume, não sabia o que dizer. Mas, a AECOPS, primeiro pela boca do seu presidente, depois, em comunicado da própria Associação, gritou contra o que considerou ser uma “ilegalidade” (irónico, vindo de quem vem...) e ameaçou com os tribunais. Agora, depois de terem dormido sobre o assunto, os arautos da infalibilidade do “livre mercado” ensaiam opiniões mais estruturadas, confundindo a medida proposta pelo PS-BE com a “Lei das Rendas” e culminando com o “argumento de ouro” desta corrente (veja-se o artigo de Helena Matos no “Público” de 2 de Agosto): “quanto vai custar o controlo proposto?” É bom que se lancem às contas porque, até agora, nunca conseguiram adiantar os valores do “descontrolo” que nos tem lixado o território e a paciência.

Se a medida for mesmo concretizada (e nestas coisas, a experiência mostra que o “se” faz todo o sentido), é a primeira vez que se admite uma intervenção disciplinadora num mercado que nunca funcionou, que fabricou as fortunas mais fáceis e suspeitas dos últimos anos e que mais contribuiu para o desordenamento do nosso território. Como já foi reconhecido pelo próprio Sá Fernandes, não se trata de uma “revolução” na gestão autárquica, mas tão somente de aplicar normas que existem em grande parte das cidades do mundo, de modo a evitar perversões como as que temos vivido, em que o excesso de oferta (calcula-se em cerca de meio milhão o número de fogos excedentários) não se traduz num abaixamento dos preços. Como é que isso pode ser feito? As possibilidades são várias, baseadas na criação de áreas em que, por exemplo, se controla a aplicação de margens de lucro, se condicionam valores ao rendimento do cliente, etc. Longe de serem novos bairros sociais, é precisamente o contrário desse princípio. Com inevitáveis impactos no mercado...

Não sabemos de que modo vai ser aplicada a medida e não temos ilusões quanto à necessidade de se fazer mais, nomeadamente alterando a “Lei dos Solos”. Mas, se for bem pensada, pode ter consequências importantes no combate à especulação imobiliária. Sobretudo se fizer “escola”. Resta saber se António Costa não vai encontrar resistências da parte de quem menos espera, nomeadamente do governo a que, até há pouco pertenceu, “espetando-se” nalgum PIN (Projectos de Interesse Nacional) que lhe acabe, também, com “corredores verdes” e frentes ribeirinhas. Gentinha de alfinete em punho, é coisa que não falta.