quinta-feira, julho 23, 2009

Três ou quatro reflexões em torno de uma garrafa de água


Steve Greenburg (campanha organizada nos Estados Unidos)

"Moradores de uma cidade rural australiana votaram para banir a venda de água engarrafada. São a primeira comunidade no mundo a tomar esta medida. A localidade chama-se Bundanoon comemoraram a aprovação da medida numa reunião na cidade (...)"- iol Diário, via A Ilusão da Visão. Ver também aqui.

Primeiro era uma extravagância, depois ganhou estatuto de hábito e hoje é algo que consideramos tão natural como a roupa que vestimos- sim, faz parte do traje. Refiro-me à garrafinha de água, maioritariamente de plástico, que nos acompanha nos mais insignificantes momentos, como se todos fossemos atletas de alta competição em risco de desidratar.

Só que tal garrafinha está muito longe de ser a versão moderna do cantil, reflectindo antes uma total desconfiança na qualidade do líquido que nos sai das torneiras. De acordo com dados publicados na comunicação social, 40% dos portugueses justificavam desse modo o recurso à água engarrafada. E aqui começa um problema: ao mesmo tempo que se criam condições para um negócio gigantesco, reduz-se a pressão sobre os serviços para garantirem a e informarem sobre a qualidade da água do abastecimento público. A garrafinha simboliza, de facto, um cair de braços, uma desistência, ainda por cima sem a garantia de conseguirmos um produto mais seguro. Em 2006, a Câmara de São Francisco deliberou a proibição de compra de água engarrafada pelos seus serviços, na sequência de um longo processo em que, entre outros problemas, algumas marcas foram obrigadas a reconhecer que a água que vendiam era a mesma que era fornecida pelos serviços municipais.

Em garrafa ou garrafão, só na aparência é "pura e cristalina" a água assim comercializada. Muito longe da inocência que lhe associamos, é um problema ambiental, um peso nos orçamentos familiares e um risco para os direitos dos cidadãos. Os dados divulgados em 2008 pelo Centro Nacional Independente de Informação sobre Resíduos, referiam um uso , anual, de cerca de 2,7 milhões de toneladas de derivados de petróleo, para produzir as embalagens. Quanto ao peso no orçamento das famílias, é só fazer contas, tendo em conta que três quartos dos portugueses são clientes fieis. Por último, mas não menos importante, o negócio tem estimulado a privatização das fontes de captação, estratégia que alguns defendem dever ser alargada a todo o abastecimento público (ver aqui, aqui e aqui).

Vouzela não é excepção no que diz respeito às dúvidas sobre a qualidade da água do sistema público de abastecimento. Acreditamos (e desejamos!) que sejam infundadas(1)- o que não podem é ser ignoradas. Fez bem a Delegada de Saúde, Dra. Maria Alexandre Cruz, quando em 2008 declarou ao Notícias de Vouzela: “(...) há sistemas de tratamento deficientes e deficientes zonas de protecção das origens/ captações, situações estas que, embora não nos tenham originado até hoje grandes preocupações, exigem da parte dos responsáveis solução eficaz e urgente (...)”. Confiamos mais em quem não nos esconde os problemas. Mas falta o resto. Em primeiro lugar, falta reconhecer interesse nos responsáveis locais pela recuperação dos nossos recursos hídricos (e as eleições aqui tão perto...). Depois, falta informação. Para quem, no início do mandato, deu tanta importância à imagem e à comunicação com os munícipes, o silêncio que sobre este assunto tem caracterizado a autarquia, alimenta as maiores suspeitas. Ou também vai aparecer alguém a defender que não é da sua competência?
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(1)- Dados sobre as análises efectuadas em 2007 à água para consumo humano no concelho de Vouzela (ver aqui)

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