quinta-feira, dezembro 17, 2009

Quando as botas (dos adversários) eram "providas de brochas e pregos salientes"


A Associação de Futebol "Os Vouzelenses", iniciou o ciclo do seu 80º aniversário. Pensada em 10 de Novembro de 1929, viu os seus estatutos aprovados em 5 de Janeiro de 1930 e, em 10 de Agosto desse ano, durante as Festas do Castelo, inaugurou o campo das Chãs- por uma vez, uma obra foi rápida em Vouzela. Para comemorar a efeméride, o Pastel de Vouzela vai continuar a publicar alguns apontamentos sobre a colectividade, na linha do que já fizemos no passado dia 11 de Novembro com uma breve referência aos Estatutos iniciais.

Estava-se em 1938 e os Vouzelenses acabavam de atravessar um longo período de inactividade. No entanto, logo em Fevereiro era dada notícia de importante doação para reabilitar o campo e publicavam-se apelos inflamados ao reavivar do entusiasmo de "há 6 e 7 anos". Os jogos iam recomeçar.

Em 20 de Março de 1938, Vouzela mobilizou-se para receber a equipa do Escola Livre d'Azemeis, acompanhada de numerosa legião de adeptos. Recepção ao estilo do tempo, envolveu filarmónica e fogo de artifício, a que se seguiram discursos de forte pendor patriótico e um prolongado almoço no Monte Castelo que terminou por volta das quatro da tarde. O jogo veio depois.

Jogadores alinhados, directores em campo, troca de galhardetes (mais precisamente, uma jarra com o emblema da Escola de Oliveira de Azemeis e um ramo de flores) e escolha do árbitro. Dezassete minutos após o início, já se registava um empate a uma bola e alguma violência que, a acreditar na crónica de R.X.(1), se devia, apenas, às atitudes do adversário e à complacência do juiz da partida. Ainda a primeira parte não tinha acabado e já o guarda-redes vouzelense (Bernardino) era obrigado a abandonar por lesão, sendo substituído por um jogador de campo (Ângelo). Quando chegou o intervalo, o resultado equilibrado contribuiu para acalmar os ânimos: 3-3.

Oito minutos após o início do segundo tempo, os Vouzelenses adiantaram-se no marcador e estabeleceram o resultado final: 4-3. Em resposta, os visitantes reforçaram as atitudes violentas, havendo notícia de lances disputados à bofetada e de sangue a escorrer das pernas e do tronco de Ângelo que, apesar de tudo, se manteve em campo "defendendo de toda a forma que lhe é possível". Aumentava o nervosismo na assistência.

Decorria o 21º minuto da segunda-parte quando a situação se descontrolou de vez: "o público invadiu o terreno e assistimos então a uma sessão de box". Dezoito minutos de pancadaria de "criar bicho" que devem ter marcado a primeira invasão de campo registada nas Chãs. Apesar de tudo, conseguiram terminar o jogo.

No final da sua crónica, o repórter sublinhava: "Enquanto a maior parte dos jogadores vouzelenses iam à farmácia, tivemos ocasião de vêr, na séde da Associação, que as botas de futebol com que os escolares jogaram, eram providas de brochas e pregos salientes, sem respeito algum pelas regras futebolísticas!". Nada que impedisse a merenda que se seguiu...

Para a história, regista-se a constituição da equipa de Vouzela: Bernardino, Carvalho e Teles; Ângelo, Alexandre (cap.) e Vitória; Pepe, Frederico, Silvestre, Fernado e Pinto.
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(1)- Notícias de Vouzela, 1 de Abril de 1938. "R.X", talvez tenha sido uma adaptação local do famoso "Repórter X".

1 comentário:

CP disse...

"... providas de brochas e pregos salientes."

Tempos incríveis.