quinta-feira, julho 12, 2007

Eles têm medo... 2

George Grosz

Bem se pode dizer que é “morto por ter cão, morto por não ter”. Se a população toma conta da rua para manifestar o seu descontentamento, é apelidada de arruaceira e antidemocrática. Se aguarda por uma oportunidade “institucional” para intervir, fica limitada aos períodos eleitorais (e ao aparelho dos partidos), ou arrisca-se a ser impedida de apresentar os seus argumentos. Veja-se o que se passou, recentemente, na Moita, onde se impediu a intervenção dos cidadãos numa sessão pública da Câmara, contrariamente ao que prevê a lei. Exemplos destes encontram-se um pouco por todo o país. E se pensamos, sinceramente, que “eles NÃO são todos iguais” e que ainda há quem se reja por princípios, não temos qualquer ilusão sobre a capacidade de uma corrente política, por si só, repelir o manobrismo dos interesses, se representar o degrau certo no acesso às benesses do poder.

Na verdade, as limitações da democracia representativa, encontram o seu expoente máximo na organização do nosso poder local. Concentrando excessivos poderes no executivo camarário, não permite controlo por parte de outros órgãos, como as assembleias municipais que, mesmo com uma composição política diferente, não têm o tempo nem os meios para o fazer. Muito menos permite a participação activa dos cidadãos. Não deixa de ser significativo que as propostas de alteração defendidas pelos grandes partidos, apontem para o agravamento da perversão- a proximidade aos eleitores, não passa de uma imagem bonita de propaganda.

Não é, então, de estranhar, que um número cada vez maior de pessoas vejam as autarquias como “agências de favores” mais ou menos ilegais, indiferentes às necessidades dos munícipes. Desordenamento (e privatização) do território, ocupação excessiva do solo, degradação dos recursos hídricos e do património natural e edificado, são o retrato do poder local que temos. Conivência com os interesses da especulação imobiliária, financiamento ilegal dos partidos políticos, corrupção, despesismo, impunidade, são a sua caricatura. E escândalos. Muitos escândalos.

A este respeito, tem sido interessante ver a ginástica de alguns dos candidatos à Câmara Municipal de Lisboa. Confrontados com uma situação financeira calamitosa que vai limitar a próxima vereação a um escritório de contabilidade, foram obrigados a reconhecer o mau serviço prestado por algumas empresas municipais (esse monumento da “engenharia” financeira). Verifica-se, até, um estranho consenso quanto à necessidade de acabar com várias. Só que ainda ninguém foi obrigado a explicar o que justificou a sua criação, já que foram da responsabilidade dos partidos que sempre governaram a autarquia e que, agora, tentam aparecer com a luminosa auréola dos anjos...

No entanto, pela voz de Helena Roseta, começa a agitar-se a alternativa: porque não, transferir a gestão das habitações sociais para os moradores? Que tal, promover um “urbanismo participado”, apelando à população para influenciar as principais orientações? Pois é. Bem vistas as coisas, a participação directa dos cidadãos pode estender-se a vários domínios da gestão local, com indiscutíveis vantagens: estimula uma maior responsabilização, melhora a relação dos projectos com aqueles que lhe vão dar vida, é barato. Também permite um maior controlo das intervenções no espaço e aumenta a capacidade de denúncia. E é isso que lhes mete medo, mete muito medo.

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