Edital
Aproximava-se 1958 e a campanha eleitoral que fez tremer Salazar. Os jornais de todo o país publicavam editais divulgando as normas para o recenseamento eleitoral- isso mesmo fez o “Notícias de Vouzela”, logo no primeiro dia de Janeiro de 1957. Privilegiavam-se os “chefes de família”, “cabeças de casal” do sexo masculino que soubessem ler e escrever ou, não sabendo, pagassem ao Estado, “contribuição predial, contribuição industrial, imposto profissional e imposto sobre aplicação de capitais” em valor não inferior a 100$00. Seguia-se à letra o ditado “enquanto há calças não se confessam saias”, assumindo que essa coisa de meter o bedelho nos destinos da Nação, dependia, sobretudo, do tamanho da bolsa de cada um.
No entanto, quando se tratava de dar voz à vontade feminina, a malha apertava-se. Subiam as exigências de habilitações literárias, muito longe da condição masculina de saber rascunhar o nome. Senhora que quisesse depositar o seu voto na urna, tinha que provar possuir, pelo menos, “curso geral dos liceus”, “curso do magistério primário”, “curso das Escolas de Belas Artes”, “curso do Conservatório Nacional ou Conservatório de Música do Porto”, “cursos dos institutos industriais e comerciais”. Mas, se porventura quisesse fazer valer o seu capital, o valor mínimo do imposto subia para 200$00 e, ao contrário do senhor seu marido, não era dispensada de apresentar prova quanto às competências básicas do ler e do escrever.
Igualmente significativo quanto aos conceito de sociedade e de cidadania então dominantes, é o modo como se definiam as proibições de participação no acto eleitoral. Para além dos que tivessem “ideias contrárias à existência de Portugal como Estado independente e à disciplina social”, ficavam de fora “os falidos ou insolventes enquanto não forem reabilitados”, os “indigentes e especialmente, os que estejam internados em asilos de beneficência”, os “notòriamente reconhecidos como dementes” e os também “notòriamente” carecidos de “idoneidade moral”. Terríveis estes “notoriamente” que, pela subjectividade dos conceitos em análise e pela dispensa (no caso da demência) de avaliador habilitado, atirava para um qualquer cacique local o poder da rotulagem.
No entanto, quando se tratava de dar voz à vontade feminina, a malha apertava-se. Subiam as exigências de habilitações literárias, muito longe da condição masculina de saber rascunhar o nome. Senhora que quisesse depositar o seu voto na urna, tinha que provar possuir, pelo menos, “curso geral dos liceus”, “curso do magistério primário”, “curso das Escolas de Belas Artes”, “curso do Conservatório Nacional ou Conservatório de Música do Porto”, “cursos dos institutos industriais e comerciais”. Mas, se porventura quisesse fazer valer o seu capital, o valor mínimo do imposto subia para 200$00 e, ao contrário do senhor seu marido, não era dispensada de apresentar prova quanto às competências básicas do ler e do escrever.
Igualmente significativo quanto aos conceito de sociedade e de cidadania então dominantes, é o modo como se definiam as proibições de participação no acto eleitoral. Para além dos que tivessem “ideias contrárias à existência de Portugal como Estado independente e à disciplina social”, ficavam de fora “os falidos ou insolventes enquanto não forem reabilitados”, os “indigentes e especialmente, os que estejam internados em asilos de beneficência”, os “notòriamente reconhecidos como dementes” e os também “notòriamente” carecidos de “idoneidade moral”. Terríveis estes “notoriamente” que, pela subjectividade dos conceitos em análise e pela dispensa (no caso da demência) de avaliador habilitado, atirava para um qualquer cacique local o poder da rotulagem.
Quanto ao resto, a História regista o evoluir dos acontecimentos. Em 1958, Salazar, suspeitando que Craveiro Lopes pensava substitui-lo, manobrou de modo a impedir a sua recandidatura, tendo escolhido Américo Tomás para candidato do regime. A oposição, pela primeira vez unida, apoiou Humberto Delgado. As eleições decorreram em clima de grande intimidação, não tendo sido permitido qualquer controlo do escrutínio por parte das forças contrárias à ditadura. Os resultados oficiais, deram a vitória a Américo Tomás por 75%, contra 25%. O Povo nunca acreditou. E Salazar, pelos vistos, também não, já que foram as últimas eleições presidenciais do Estado Novo por sufrágio directo (a partir dali, o Presidente passou a ser escolhido por um Colégio Eleitoral, composto por homens de confiança do regime).
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