sexta-feira, julho 26, 2013

Eleições autárquicas, como de costume


Texto publicado na "Gazeta da Beira" de 25 de Julho de 2013:

Para já, o ambiente que antecede as eleições autárquicas está a ser como de costume. Os partidos do costume, a prioridade dada a nomes em vez de ideias, como de costume. Seria importante que a nossa atitude, enquanto eleitores, não fosse a do costume e, para variar, exigíssemos antes de escolher. Avizinham-se tempos ainda mais difíceis que, para quem vive e trabalha no interior, podem atingir requintes de malvadez.

Estamos a viver uma austeridade que nos apresentam como inevitável, autêntica expiação de pecados que sabemos não ter cometido, mas de que somos constantemente acusados.  A pouco e pouco, começamos a perceber tratar-se de uma estratégia que visa  concentrar riqueza nalguns países e nalgumas instituições financeiras, à custa de um completo desinvestimento nos serviços sociais do Estado e de uma redução do preço do trabalho. De facto, não são necessárias muitas contas para percebermos que fica mais barato condenar os cidadãos a viverem amontoados num qualquer subúrbio de uma grande cidade, do que estar a organizar redes de transportes e serviços de proximidade espalhados pelo país. Além do mais, essa concentração, ao criar um aumento da procura de emprego nas zona onde há maior oferta, contribui para reduzir os salários. Pois é. Tudo se passa, como se o cidadão fosse um incómodo ou um mero joguete ao serviço de interesses alheios e não a razão última de qualquer política.  Mas, é com isso que precisamos de saber viver e, sobretudo, é a isso que precisamos conseguir responder.

Perante tais ameaças, o reduzido poder reivindicativo da região de Lafões é um problema. Os 10261 habitantes de Oliveira de Frades, os 10540 de Vouzela, ou os 16851 de São Pedro do Sul representam, isoladamente, um insignificante peso eleitoral e uma reduzida coleta de impostos para convencer os responsáveis pela atual adaptação nacional das diretivas europeias.  Mas, em conjunto, são quase quarenta mil que, ainda por cima, partilham um património natural comum ao longo dos seus quase 688 Km2. Saber rentabilizar essa força, tem que ser a primeira exigência a fazer às diversas candidaturas porque, sem isso, nada mais conseguimos.

Por outro lado, parece-nos importante termos consciência das prioridades e percebermos que,  oitenta e um mil milhões de euros depois de, em 1989, terem chegado os primeiros fundos europeus, somos um país diferente, mas nem sempre pelos melhores motivos. As autoestradas chegam-nos à porta, mas, fora dos grandes centros, não temos um sistema de transportes públicos minimamente satisfatório. Temos piscinas para todos os gostos e feitios, mas é evidente o desleixo de grande parte dos nossos recursos hídricos (o Vouga que o diga) e há inadmissíveis dúvidas sobre a qualidade da água da rede pública de todos os concelhos de Lafões.  Aumentou o espaço construído (raramente com qualidade), enquanto a população diminui a olhos vistos e é grave o desleixo em que se encontra parte significativa do património edificado. Temos "parques industriais" espalhados por todos os cantos, mas faltam empregos e fogem os jovens. Consumimos produtos das mais variadas partes do mundo, importamos enormes quantidades de carne de vaca, mas os produtores de vitela de Lafões estão cada vez mais envelhecidos e grande parte dos nossos produtos agrícolas mais característicos não passam de meras recordações. Bem precisávamos, agora, de alguns desses milhões que a Europa enviou. Não os vamos ter. Contudo, os problemas que sentimos são reais e exigem solução. São necessárias ideias, tanto ou mais do que dinheiro. Os que quiserem merecer o nosso voto têm que provar tê-las.

Por último, mas, talvez, o mais importante, é urgente estreitar a relação entre eleitores e eleitos, criando mecanismos de participação e controlo que não deixem reduzir a cidadania a atos simbólicos de quatro em quatro anos.  Ao contrário do que ele próprio gosta de apregoar, o poder local nunca foi, entre nós, um exemplo de democracia. Com um executivo dominante, debilmente controlado por assembleias municipais sem grandes condições de funcionamento, não admira que tenha sido terreno fértil para os muitos abusos de que há muito suspeitávamos e que, a pouco e pouco,  vão sendo denunciados. Com a fusão de freguesias promovida pela chamada "reforma Relvas", o problema agravou-se, na medida em que afastou os órgãos de decisão dos habitantes e aumentou a complexidade de gestão. As clientelas partidárias talvez agradeçam, mas nós... nem por isso.  É mais do que tempo de se introduzirem formas de democracia participativa que o reduzido número de habitantes das nossas freguesias facilita, conseguindo-se, desse modo, um maior envolvimento nas decisões e um mais eficiente controlo.  Até que ponto os candidatos a eleitos pelo povo têm dele receio?

Para já, o ambiente que antecede as eleições autárquicas está a ser como de costume. Mas não será o do costume aquele que se lhe irá seguir. Nos recursos disponíveis, nas exigências, na impossibilidade de falhar e, sobretudo, na capacidade de mobilização de vontades, tudo vai ser bem diferente. Seja, então, diferente também, o filtro a que submetemos as diversas candidaturas, para que os próximos quatro anos não se reduzam, como de costume, a um longo lamento em torno de oportunidades perdidas.

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