Eleições autárquicas, como de costume
Texto publicado na "Gazeta da Beira" de 25 de Julho de 2013:
Para
já, o ambiente que antecede as eleições autárquicas está a ser como de costume.
Os partidos do costume, a prioridade dada a nomes em vez de ideias, como de
costume. Seria importante que a nossa atitude, enquanto eleitores, não fosse a
do costume e, para variar, exigíssemos antes de escolher. Avizinham-se tempos
ainda mais difíceis que, para quem vive e trabalha no interior, podem atingir
requintes de malvadez.
Estamos a viver uma austeridade que
nos apresentam como inevitável, autêntica expiação de pecados que sabemos não
ter cometido, mas de que somos constantemente acusados. A pouco e pouco, começamos a perceber tratar-se
de uma estratégia que visa concentrar riqueza
nalguns países e nalgumas instituições financeiras, à custa de um completo
desinvestimento nos serviços sociais do Estado e de uma redução do preço do
trabalho. De facto, não são necessárias muitas contas para percebermos que fica
mais barato condenar os cidadãos a viverem amontoados num qualquer subúrbio de
uma grande cidade, do que estar a organizar redes de transportes e serviços de
proximidade espalhados pelo país. Além do mais, essa concentração, ao criar um
aumento da procura de emprego nas zona onde há maior oferta, contribui para reduzir
os salários. Pois é. Tudo se passa, como se o cidadão fosse um incómodo ou um
mero joguete ao serviço de interesses alheios e não a razão última de qualquer
política. Mas, é com isso que precisamos
de saber viver e, sobretudo, é a isso que precisamos conseguir responder.
Perante tais ameaças, o reduzido
poder reivindicativo da região de Lafões é um problema. Os 10261 habitantes de
Oliveira de Frades, os 10540 de Vouzela, ou os 16851 de São Pedro do Sul
representam, isoladamente, um insignificante peso eleitoral e uma reduzida
coleta de impostos para convencer os responsáveis pela atual adaptação nacional
das diretivas europeias. Mas, em
conjunto, são quase quarenta mil que, ainda por cima, partilham um património
natural comum ao longo dos seus quase 688 Km2. Saber rentabilizar essa força,
tem que ser a primeira exigência a fazer às diversas candidaturas porque, sem
isso, nada mais conseguimos.
Por outro lado, parece-nos
importante termos consciência das prioridades e percebermos que, oitenta e um mil milhões de euros depois de,
em 1989, terem chegado os primeiros fundos europeus, somos um país diferente,
mas nem sempre pelos melhores motivos. As autoestradas chegam-nos à porta, mas,
fora dos grandes centros, não temos um sistema de transportes públicos
minimamente satisfatório. Temos piscinas para todos os gostos e feitios, mas é
evidente o desleixo de grande parte dos nossos recursos hídricos (o Vouga que o
diga) e há inadmissíveis dúvidas sobre a qualidade da água da rede pública de
todos os concelhos de Lafões. Aumentou o
espaço construído (raramente com qualidade), enquanto a população diminui a
olhos vistos e é grave o desleixo em que se encontra parte significativa do
património edificado. Temos "parques industriais" espalhados por
todos os cantos, mas faltam empregos e fogem os jovens. Consumimos produtos das
mais variadas partes do mundo, importamos enormes quantidades de carne de vaca,
mas os produtores de vitela de Lafões estão cada vez mais envelhecidos e grande
parte dos nossos produtos agrícolas mais característicos não passam de meras
recordações. Bem precisávamos, agora, de alguns desses milhões que a Europa
enviou. Não os vamos ter. Contudo, os problemas que sentimos são reais e exigem
solução. São necessárias ideias, tanto ou mais do que dinheiro. Os que quiserem
merecer o nosso voto têm que provar tê-las.
Por último, mas, talvez, o mais importante,
é urgente estreitar a relação entre eleitores e eleitos, criando mecanismos de
participação e controlo que não deixem reduzir a cidadania a atos simbólicos de
quatro em quatro anos. Ao contrário do
que ele próprio gosta de apregoar, o poder local nunca foi, entre nós, um
exemplo de democracia. Com um executivo dominante, debilmente controlado por
assembleias municipais sem grandes condições de funcionamento, não admira que
tenha sido terreno fértil para os muitos abusos de que há muito suspeitávamos e
que, a pouco e pouco, vão sendo
denunciados. Com a fusão de freguesias promovida pela chamada "reforma
Relvas", o problema agravou-se, na medida em que afastou os órgãos de decisão
dos habitantes e aumentou a complexidade de gestão. As clientelas partidárias
talvez agradeçam, mas nós... nem por isso. É mais do que tempo de se introduzirem formas
de democracia participativa que o reduzido número de habitantes das nossas
freguesias facilita, conseguindo-se, desse modo, um maior envolvimento nas
decisões e um mais eficiente controlo. Até que ponto os candidatos a eleitos pelo
povo têm dele receio?
Para já, o ambiente que antecede as
eleições autárquicas está a ser como de costume. Mas não será o do costume aquele
que se lhe irá seguir. Nos recursos disponíveis, nas exigências, na
impossibilidade de falhar e, sobretudo, na capacidade de mobilização de
vontades, tudo vai ser bem diferente. Seja, então, diferente também, o filtro a
que submetemos as diversas candidaturas, para que os próximos quatro anos não
se reduzam, como de costume, a um longo lamento em torno de oportunidades
perdidas.
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