sexta-feira, março 18, 2011

Revisitar o passado

Os fundadores da Associação de Futebol "Os Vouzelenses", retirado de "Os Vouzelenses" 80 anos- Imagens com histórias.

Quando, em 1929, uma outra crise avisou o mundo dos limites do sistema e por aqui ruiam as esperanças de se encontrar uma via democrática para a dignidade humana, um grupo de vouzelenses aproveitou a criação de um simples clube de futebol para ensaiar soluções solidárias, afastadas das esferas dos poderes e unicamente alicerçadas na vontade dos homens. Os estatutos iniciais da Associação de Futebol "Os Vouzelenses", mais não eram do que o enunciar dos princípios mutualistas, tentando que a mobilização conseguida pelo espectáculo da bola conseguisse dar resposta às muitas carências então sentidas.

É curioso concluir que, hoje, mais de oitenta anos percorridos, encontramos idêntica tentação em figuras públicas, homens habituados às refregas políticas na esferea partidária. Nós próprios- reconhecêmo-lo- sentimo-nos, por vezes, a trilhar esse caminho, quando propomos mais cooperação entre as empresas do concelho e o assumir das "marcas" Vouzela e Lafões como desígnios comuns. Tal como há oito décadas atrás, está em causa a falta de confiança nos aparelhos dominantes e a esperança de que os cidadãos, através da sua iniciativa, consigam romper o círculo vicioso das falsas alternativas.

No dia 12 de Março, cerca de 200 mil pessoas desfilaram na Avenida da Liberdade e mais uns largos milhares manifestaram-se no resto do país contra a precariedade, a falta de perspectivas, em suma, o estado a que isto chegou. Foram protestos sem lideranças assumidas, de megafone aberto, onde quem queria dizia o que lhe apetecia, apenas com um elemento em comum: estarem fartos! A tudo isto, o governo respondeu com a indiferença. O mesmo já tinha acontecido após as jornadas de luta de 2008 e 2010. As forças políticas dominantes podem ter suspirado de alívio e concluído manterem o controlo das manobras de propaganda, mas, para o cidadão comum, isso não passou de mais uma prova de que existem dois mundos paralelos sem pontos de encontro (a não ser de quatro em quatro anos): o deles e o nosso. Este sentimento de já não haver conversa possível, ou é o ponto de partida para a afirmação de novas alternativas sutentadas numa maior participação popular, ou arrisca-se a ser o toque a finados da própria democracia.

PAGAR NACIONAL, SOFRER (E AGIR) LOCAL

Primeiro vieram os deputados do PS eleitos pelo distrito de Viseu. Seguiram-se, claro está, os do PSD. Naquela jeito de encarar o país como um conjunto de empreitadas, visitaram "obra". Naquele jeito de encarar a função parlamentar como um concurso de audiências, comprometeram-se a levar recados. Tenha-se em conta de que estamos a falar de pessoas que, pela sua função, têm acesso a informações privilegiadas, a estudos que muito úteis podiam ser a quem, desesperadamente, procura a saída do buraco. Gente que, num momento como o que vivemos, podia apontar alternativas, dar sugestões. Nada disso. São homens nados e criados nas incubadoras de ideias de como gastar fundos e outras ideias não têm. Para agravar a coisa, também já não têm fundos, gastos em obra que foi um fim em si mesma, em vez de princípios facilitadores para reorganizar actividades e reorientar investimentos. Obra, por incrível que pareça, insuficiente, como ficou claro na intervenção do presidente da Junta de Queirã que ainda reivindica... saneamento básico. Básico, sem dúvida.

Quando, em 1929, os fundadores da Associação de Futebol "Os Vouzelenses" tentaram criar condições para resolver localmente o que já não acreditavam que viesse a ser resolvido pelas cúpulas nacionais, podem ter sido ingénuos, ter arranjado uma carga de trabalhos (e alguns arranjaram...), mas reflectiam a desconfiança que então se sentia nas "lideranças" e manifestavam uma profunda confiança nos cidadãos. Oitenta anos passados, vale a pena revisitar esses exemplos a que hoje, se quiserem, até podem chamar "redes sociais", assim a modos que um "Facebook" ao vivo. Adiciono já como amigo.