Haja saúde
Apesar de recente, a “carreira política” já revela tiques corporativos. Ataque-se o seu espaço e a sua liberdade de manobra e imediatamente se verifica um amplo consenso na defesa dos princípios da “arte de bem governar” que tem no “Bloco Central” o seu guardião. A recente onda de contestação às “reformas” dos serviços de Saúde proporcionou-lhe mais um esclarecedor momento de exibição.
Comentando as declarações do Presidente da República que deu a entender não se perceberem os objectivos das mexidas na Saúde, Pacheco Pereira, numa intervenção na SIC-Notícias, “despachou” o assunto dizendo que há reformas que não se conseguem explicar. Correia de Campos, numa longa estadia nos estúdios da RTP, tentou puxar dos galões, dando como argumento o facto de saber de Saúde mais do que a média. José Junqueiro, deputado e líder do PS de Viseu, lamentou a “desinformação” de que todos nós, simples e humildes cidadãos, estamos a ser vítimas e que nos impedem de compreender o verdadeiro alcance das reformas em curso, rematando com a garantia de que "o PS, através dos seus deputados, será sempre o primeiro a exigir a rectificação deste novo modelo se, eventualmente, se constatar que, na prática, pode prejudicar a assistência e cuidado que são devidos a todas as pessoas".
Acrescente-se o facto do PSD ter sido o único partido que evitou comentar a mensagem de Ano Novo de Cavaco Silva (onde, para além dos problemas com a Saúde, abordou o tema da desertificação do Interior e dos vencimentos de alguns gestores que considerou excessivos), e facilmente concluímos que basta tentar controlar um pouco mais a sua acção, obrigá-los a fundamentar melhor as suas posições, para que a reduzida diferença existente entre os dois partidos se esbata de vez. De facto, o que os preocupa não é tanto o sucesso desta ou daquela medida em concreto, mas antes que se questionem formas de exercício e facilidades de acesso do e ao poder. Não é difícil prever que novos e esclarecedores momentos de unidade irão surgir quando (ou se) forem obrigados a justificar a não realização do referendo ao Tratado Europeu ou a defenderem as alterações à legislação eleitoral.
De acordo com os especialistas na área da Saúde, justificam-se muitas das medidas tomadas por Correia de Campos. Algumas delas são, até, orientações internacionais da responsabilidade da Organização Mundial de Saúde. Isso não invalida a crítica que lhe fazemos de ter sido completamente incompetente no modo como as explicou e aplicou, erro grave para quem se reconhece com conhecimentos na área superiores aos da média.
Esta faixa do território conhece, como nenhuma outra, o significado de envelhecimento, de isolamento, de abandono. A segurança real da proximidade de um médico durante 24 horas, com reduzidas capacidades de actuação, podia não ser mais do que uma questão de “fé”, mas era sinceramente sentida como um factor de segurança. António Arnaut, “pai” do Serviço Nacional de Saúde e fundador do Partido Socialista, chamou a atenção para isso, quando se percebeu que os conhecimentos técnicos do actual ministro, não eram acompanhados por idênticos conhecimentos na área social. Correia de Campos mostrou-se completamente indiferente ao pormenor.
Tivesse havido o cuidado de ouvir as pessoas, de compreender as suas preocupações e anseios e facilmente se teria montado uma estratégia que, em primeiro lugar, ganhasse a sua confiança. Por exemplo, criando apoios próximos, domiciliários, adequados à idade avançada que têm muitos dos utentes dos serviços de Saúde. Sim, porque acreditar que basta haver estradas novas para que os problemas de comunicação estejam resolvidos; usar distâncias entre sedes de concelho e hospitais centrais, ignorando a existência de localidades espalhadas pela serra; não atender à capacidade real de muitas pessoas em estabelecerem um contacto correcto com os serviços do INEM, “cheira” logo a “urbanóide” a olhar para o país a partir de um gabinete e levanta as maiores suspeitas.
Aliás, não deixa de ser curioso confrontar os argumentos dos que vieram a terreiro na defesa da sua “dama política”, com os dos que há muitos anos andam nestas coisas e conhecem os seus pontos fracos. Compare-se o que foi dito pelo deputado José Junqueiro sobre a abundância de oferta de serviços de ambulâncias (aqui), com as opiniões dos comandantes dos bombeiros de Vouzela e de São Pedro do Sul (aqui).
Contrariamente ao que afirmou Pacheco Pereira, só não sabe explicar quem não domina um assunto. O conhecimento é a chave que permite descodificar a complexidade das coisas, mesmo que daí surjam novas “complexidades”. Isto é verdade para todas as áreas, estejamos a falar de Saúde, ou do Tratado Europeu. Por isso, quando um “especialista” não explica e se refugia na abrangência de um tema, ou não sabe, ou esconde. Esconde, por exemplo, o facto de medidas como as que se estão a aplicar na Saúde, serem estruturantes do ponto de vista do ordenamento do território, empurrando a população daqui para fora ou para os “braços protectores” do “comércio da terceira-idade”. Esconde que a haver um incorrecto dimensionamento dos serviços, isso deve-se aos responsáveis do PS e do PSD. Esconde, ainda, que se a região de Lafões nunca foi usada como uma área de organização de serviços mais racional, isso deve-se às absurdas propostas de reorganização administrativa do PS e do PSD e às opções dos seus eleitos locais.
Assim, a promessa do deputado José Junqueiro não deve ser suficiente para descansar quem quer que seja. Não somos cobaias nem admitimos que nos tratem como tal. Mais do que termos garantias de “rectificação deste novo modelo se, eventualmente, se constatar que, na prática, pode prejudicar a assistência e cuidado que são devidos a todas as pessoas", queríamos estar seguros de que o possível tinha sido feito, antes da aplicação do “novo modelo”, para reduzir o risco dele vir a “prejudicar a assistência e cuidado que são devidos a todas as pessoas".
Foi por isso que nos mobilizámos à porta do Centro de Saúde (onde estavam vários eleitos do Partido Socialista, registe-se, provando haver laços bem mais fortes) e esperamos que nos voltemos a mobilizar contra as alterações à Lei Eleitoral combinadas entre o PS e o PSD. Já que é tão difícil governarem-nos, explicarem-nos o elementar, é preferível assumirmos, de uma vez por todas, que nós somos os melhores representantes da nossa própria vontade. Haja saúde.
Comentando as declarações do Presidente da República que deu a entender não se perceberem os objectivos das mexidas na Saúde, Pacheco Pereira, numa intervenção na SIC-Notícias, “despachou” o assunto dizendo que há reformas que não se conseguem explicar. Correia de Campos, numa longa estadia nos estúdios da RTP, tentou puxar dos galões, dando como argumento o facto de saber de Saúde mais do que a média. José Junqueiro, deputado e líder do PS de Viseu, lamentou a “desinformação” de que todos nós, simples e humildes cidadãos, estamos a ser vítimas e que nos impedem de compreender o verdadeiro alcance das reformas em curso, rematando com a garantia de que "o PS, através dos seus deputados, será sempre o primeiro a exigir a rectificação deste novo modelo se, eventualmente, se constatar que, na prática, pode prejudicar a assistência e cuidado que são devidos a todas as pessoas".
Acrescente-se o facto do PSD ter sido o único partido que evitou comentar a mensagem de Ano Novo de Cavaco Silva (onde, para além dos problemas com a Saúde, abordou o tema da desertificação do Interior e dos vencimentos de alguns gestores que considerou excessivos), e facilmente concluímos que basta tentar controlar um pouco mais a sua acção, obrigá-los a fundamentar melhor as suas posições, para que a reduzida diferença existente entre os dois partidos se esbata de vez. De facto, o que os preocupa não é tanto o sucesso desta ou daquela medida em concreto, mas antes que se questionem formas de exercício e facilidades de acesso do e ao poder. Não é difícil prever que novos e esclarecedores momentos de unidade irão surgir quando (ou se) forem obrigados a justificar a não realização do referendo ao Tratado Europeu ou a defenderem as alterações à legislação eleitoral.
De acordo com os especialistas na área da Saúde, justificam-se muitas das medidas tomadas por Correia de Campos. Algumas delas são, até, orientações internacionais da responsabilidade da Organização Mundial de Saúde. Isso não invalida a crítica que lhe fazemos de ter sido completamente incompetente no modo como as explicou e aplicou, erro grave para quem se reconhece com conhecimentos na área superiores aos da média.
Esta faixa do território conhece, como nenhuma outra, o significado de envelhecimento, de isolamento, de abandono. A segurança real da proximidade de um médico durante 24 horas, com reduzidas capacidades de actuação, podia não ser mais do que uma questão de “fé”, mas era sinceramente sentida como um factor de segurança. António Arnaut, “pai” do Serviço Nacional de Saúde e fundador do Partido Socialista, chamou a atenção para isso, quando se percebeu que os conhecimentos técnicos do actual ministro, não eram acompanhados por idênticos conhecimentos na área social. Correia de Campos mostrou-se completamente indiferente ao pormenor.
Tivesse havido o cuidado de ouvir as pessoas, de compreender as suas preocupações e anseios e facilmente se teria montado uma estratégia que, em primeiro lugar, ganhasse a sua confiança. Por exemplo, criando apoios próximos, domiciliários, adequados à idade avançada que têm muitos dos utentes dos serviços de Saúde. Sim, porque acreditar que basta haver estradas novas para que os problemas de comunicação estejam resolvidos; usar distâncias entre sedes de concelho e hospitais centrais, ignorando a existência de localidades espalhadas pela serra; não atender à capacidade real de muitas pessoas em estabelecerem um contacto correcto com os serviços do INEM, “cheira” logo a “urbanóide” a olhar para o país a partir de um gabinete e levanta as maiores suspeitas.
Aliás, não deixa de ser curioso confrontar os argumentos dos que vieram a terreiro na defesa da sua “dama política”, com os dos que há muitos anos andam nestas coisas e conhecem os seus pontos fracos. Compare-se o que foi dito pelo deputado José Junqueiro sobre a abundância de oferta de serviços de ambulâncias (aqui), com as opiniões dos comandantes dos bombeiros de Vouzela e de São Pedro do Sul (aqui).
Contrariamente ao que afirmou Pacheco Pereira, só não sabe explicar quem não domina um assunto. O conhecimento é a chave que permite descodificar a complexidade das coisas, mesmo que daí surjam novas “complexidades”. Isto é verdade para todas as áreas, estejamos a falar de Saúde, ou do Tratado Europeu. Por isso, quando um “especialista” não explica e se refugia na abrangência de um tema, ou não sabe, ou esconde. Esconde, por exemplo, o facto de medidas como as que se estão a aplicar na Saúde, serem estruturantes do ponto de vista do ordenamento do território, empurrando a população daqui para fora ou para os “braços protectores” do “comércio da terceira-idade”. Esconde que a haver um incorrecto dimensionamento dos serviços, isso deve-se aos responsáveis do PS e do PSD. Esconde, ainda, que se a região de Lafões nunca foi usada como uma área de organização de serviços mais racional, isso deve-se às absurdas propostas de reorganização administrativa do PS e do PSD e às opções dos seus eleitos locais.
Assim, a promessa do deputado José Junqueiro não deve ser suficiente para descansar quem quer que seja. Não somos cobaias nem admitimos que nos tratem como tal. Mais do que termos garantias de “rectificação deste novo modelo se, eventualmente, se constatar que, na prática, pode prejudicar a assistência e cuidado que são devidos a todas as pessoas", queríamos estar seguros de que o possível tinha sido feito, antes da aplicação do “novo modelo”, para reduzir o risco dele vir a “prejudicar a assistência e cuidado que são devidos a todas as pessoas".
Foi por isso que nos mobilizámos à porta do Centro de Saúde (onde estavam vários eleitos do Partido Socialista, registe-se, provando haver laços bem mais fortes) e esperamos que nos voltemos a mobilizar contra as alterações à Lei Eleitoral combinadas entre o PS e o PSD. Já que é tão difícil governarem-nos, explicarem-nos o elementar, é preferível assumirmos, de uma vez por todas, que nós somos os melhores representantes da nossa própria vontade. Haja saúde.
1 comentário:
Valente...
O marasmo político-social para que os Vouzelenses se têm vindo a remeter, já merecia um abanão, que de alguma forma este texto dá. "Como é dificil governar..." Então que governe quem sabe (contando com os que já o fazem, mas que pelos vistos pouco aprenderam). Para muitos o que importa é ser-se Presidente ou vereador (isto no caso das hierarquias mais baixas) para se ter o devido destaque, não tanto político, mas mais aquele que eleva os egos e o pseudo-social.
Depois de tantos anos ainda não perceberam que o seu último destino é passar ao anonimato de que saíram, no fundo o lugar que lhes é merecido.
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