terça-feira, julho 31, 2007

RSI ou o preço da indiferença

Nos últimos dias têm sido divulgados números sobre o Rendimento Social de Inserção (RSI) que representam sinais de alarme sobre a sociedade que estamos a construir(1). De facto, para além das muitas deficiências detectadas no apoio aos cidadãos mais carenciados, corre-se o risco de uma medida pensada como apoio transitório, ser transformada em modo de vida. A nossa região, não é excepção à regra.

Num total nacional de 106570 famílias abrangidas pelo RSI, o distrito de Viseu contribui com 6157 famílias, depois de, em 2002, terem sido apoiadas 8598. Na lista de candidaturas apresentadas no primeiro semestre de 2007, Viseu aparece em oitavo lugar com 1004 pedidos, apenas sendo ultrapassado pelos distritos do Porto (top nacional), Setúbal, Lisboa, Aveiro, Coimbra, Braga e Faro.

Mesmo o facto do nosso distrito incluir o grupo restrito dos que revelaram evolução positiva entre 2002 e 2007, só por demagogia pode ser entendido com optimismo. Na verdade, a desertificação progressiva e o envelhecimento da população que se têm feito sentir, mais do que quaisquer medidas de integração que tenham sido tomadas, devem explicar a diferença. De qualquer modo, os números mantêm-se muito altos.

Não é difícil perceber que estamos a assistir às consequências do desprezo pelas actividades tradicionais (agricultura, pecuária, etc.), que não só não foram reorganizadas, como ainda não viram surgir alternativas. Mesmo que queiramos olhar o problema com “espírito positivo”, dizendo que o RSI é capaz de ser superior ao rendimento conseguido, antigamente, no trabalho da terra, a desculpa não pega. Se já é difícil compreender que nenhum esforço tenha sido feito na reconversão da agricultura tradicional, tendo em conta o seu valor social e ambiental, mais difícil é aceitar que se pague para que pessoas esperem pela morte, desprezando os seus conhecimentos e recusando-lhes o direito de se sentirem socialmente úteis. Talvez daqui a uns anos venhamos a lamentar a adaptação portuguesa de uma piada dos tempos do “Muro de Berlim”, quando se dizia que a maior aspiração dos jovens da Alemanha de Leste, era serem desempregados na República Federal Alemã. O RSI corre o risco de se tornar modo de vida, para descanso de algumas consciências.

Quando vemos o Presidente da Câmara Municipal de Vouzela, (na apresentação do “Diagnóstico da Necessidades de Qualificação de Recursos Humanos na Região de Lafões”) colocar o acento tónico na inventariação das “necessidades de qualificação ao nível da educação e formação e conduzir a um ajustamento entre a oferta de formação e as necessidades do sector empresarial”, percebemos que poucas lições se têm tirado do estado a que chegamos. Diga o senhor Presidente que empregos tem para oferecer, que as habilitações são o mais fácil de conseguir. O problema, é que não tem. Nem vai ter, enquanto os responsáveis locais acreditarem que as “empresas de ponta” desse mundo inteiro, vão acorrer a montar unidades na região, bastando para tal que se lhes mostre as elevadas competências do indígena (2), a Matemática e a mais não sei o quê. Enquanto assim for, restam os estudos para fingir que se faz alguma coisa e o RSI, para pagar a indiferença.
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(1)- Fonte: "Público" de 30 e 31 de Julho de 2007.
(2)- Indígena: natural da região que habita.

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