O indiferentismo
“O velho costume de esperar que os outros façam ou que as coisas apareçam feitas, sem canseiras nem arrelias, deixando correr tudo ao Deus-dará, é péssimo, e, contra êle, todo o vouzelense brioso e zeloso deve insurgir-se, trabalhando cada qual o mais que possa, para que alguma coisa mais se faça, de útil e proveitoso.
O indiferentismo é um crime, e, na nossa terra, o inimigo”.
-H. Simões da Silva, Notícias de Vouzela, 1 de Abril de 1936
No debate em torno do nosso texto sobre a “Casa das Ameias”, veio à baila um velho argumento usado por estas bandas, que, de tão velho, quase merece constar na galeria do nosso património colectivo: a falta de dinamismo da nossa iniciativa privada. Recordámo-nos, então, de um longo texto publicado no Notícias de Vouzela de 1 de abril de 1936, da autoria do seu director, H. Simões da Silva. Intitulava-se “O indiferentismo- eis o inimigo!” e é dele que retirámos a citação inicial.
A acusação de “indiferentismo” ou de falta de dinamismo, foi usada contra todos os grupos sociais (mais abertamente em relação a uns do que a outros) e nas mais diversas circunstâncias. Ou porque ninguém se mostrava disponível para tomar conta de uma colectividade, ou porque era necessário um terreno para uma obra pública e os proprietários faziam-se desentendidos, ou porque faltava dinheiro para uma qualquer iniciativa que os “homens de cabedal” do concelho tardavam em apoiar.
Claro que este problema não é um exclusivo nosso e reflecte a excessiva concentração de riqueza e de propriedades, típica de meios onde a terra, normalmente transmitida através de heranças, se mantinha na mesma família durante gerações e gerações. Desse modo, qualquer iniciativa acabava por “tropeçar” na propriedade deste ou daquele que, ou colaborava, ou “matava” todos os sonhos, perante o olhar impotente dos que tinham ideias, mas...nada mais. A História local regista os bons exemplos e o anedotário os restantes.
Perante isto, o que nos resta? Precisamente o mesmo que aos nossos antepassados, embora ajudados (e de que maneira!) pela democracia em que vivemos: a pressão que, hoje, pode ser feita por uma opinião pública forte, informada, reivindicativa. Daí não se perceber muito bem os que criticam quando se exige acção dos poderes públicos e continuam à espera das boas vontades privadas. Na prática, promovem o conformismo, o “indiferentismo” que, tal como no passado, “é um crime, e, na nossa terra, o inimigo”.